RU486: UM PRODUTO QUE MATA |
As primeiras vítimas conhecidas do RU486
Anexo: um acidente previsível
Síntese e resultado
AS PRIMEIRAS VÍTIMAS
CONHECIDAS DA RU 486
24/05/1993
OS FATOS
Aos 31 anos de idade, Nadine WALKOWIAK, que já tinha quatro filhos de uma relação
anterior, teve mais cinco com o senhor P., um operário, e estas cinco crianças conviviam com eles no domicílio
conjugal.
Em março de 1991, Nadine, duvidando em dar continuidade a uma nova gravidez, faz uma consulta ao
médico da família, Doutor Patrick ANNIC. Durante uma visita à casa de Nadine, o médico lhe recomenda
um teste de gravidez, cujo resultado foi conhecido no dia 19 de março, e, no dia seguinte, lhe entrega uma carta
para ser encaminhada a Planejamento Familiar de Lens. No dia 21 de março, Nadine WALKOWIAK se apresenta a Planejamento
Familiar e cumpre com as formalidades necessárias para fazer um aborto. Aborta em seguida, sem mais formalidades,
ao tomar três comprimidos de MIFEGYN 200 mg (RU 486), na presença do doutor PAS, médico do centro de
abortos de Lens.
O prazo legal contemplado de uma semana, estabelecido no caso de um pedido de aborto, não foi respeitado.
Em 23 de março de 1991, às 10:15h., a senhora WALKOWIAK recebe uma injeção
de meia ampola (250 microgramas) de NALADOR, por via intramuscular. Morre nesse mesmo dia, às 20hs., de um infarto
maciço do miocárdio.
O senhor P., pelo fato de ter de criar seus cinco filho sozinho, é obrigado a deixar o trabalho,
principalmente porque seu amor de pai e seu sentido do dever parental o impedem de pôr seus filhos na DASS.
Depois desse drama, o hospital manifesta que o acidente, no momento, era absolutamente imprevisível,
o que é falso (ver anexo, "Um acidente previsível").
UM JORNALISTA DE VERDADE
Nada teria saído à luz sobre o assunto se um jornalista do "La voix du Nord" não
tivesse recebido um telefonema de um de seus informantes no hospital. Isto lhe permitiu chegar rapidamente à instituição
e começar a investigar. Só depois o governo interveio, aparentemente para evitar que o caso tivesse maior
ressonância que a desejada.
Este fato e a simples estatística confirmam nossa suspeita de que Nadine WALKOWIAK não tenha
sido a única vítima do RU 486; nem todos contam com bons informantes nos hospitais.
A CAUSA É REABERTA
O acidente era perfeitamente previsível porque os médicos, além de contar com todos
os dados da paciente, conheciam muito bem o produto. Portanto, somente a leviandade, a pressa, em uma única palavra,
a imprudência, pode tê-los levado a optar por este procedimento.
Em 1992, a associação "La Trêve de Dieu" entra em contato com a família
de Nadine WALKOWIAK. Com o consentimento da família, a associação decide defendê-los e assisti-los,
criando o Comitê de Ajuda à família de Nadine WALKOWIAK.
É preciso dizer que o anterior advogado do Sr P., nomeado de ofício, era
comunista. E é verdade que fez o que devia para iniciar a querela, mas não "impulsou" o expediente.
Em setembro de 1992, o Doutor de SAINT-JUST encarrega-se do caso. Realmente, o juiz de instrução
estava a ponto de encerrar o expediente por falta de méritos, apesar de não ter tido
acesso sequer aos elementos essenciais do caso, especialmente à certidão de óbito feita após
a autópsia de Nadine.
Em dezembro de 1992, o Doutor de St-Just oferece novos elementos aos autos de instrução e
a causa é reaberta.
Existem, então, duas acusações possíveis neste inquérito:
- homicídio involuntário e
- engano sobre as propriedades intrínsecas do produto vendido.
As pessoas processadas podem ser:
- os médicos que prescreveram;
- os médicos que realizaram o aborto;
- os funcionários e responsáveis públicos que permitiram a administração deste produto
abortivo e
- os inventores, fabricantes e encarregados da propaganda de ditas substâncias.
O comitê de ajuda distribuiu milhares de folhetos, não só em toda a região de
Lens, mas também no hospital. O próprio Sr. P, inclusive, e um amigo distribuíram o material no centro
de abortos. Neste centro, uma jovem que esperava sua vez, ao ver a fotografia de uma mulher estampada na propaganda volante
que o próprio Sr P. tinha lhe entregado, perguntou: "Quem é?". Ao escutar a resposta: "
Minha mulher", compreendeu então o risco que podia estar correndo e anulou sua inscrição.
Na noite do dia 30 de dezembro de 1992, tem lugar uma cerimônia em homenagem à Nadine WALKOWIAK,
com a presença do seu marido e filhos. A imprensa local se faz presente, sendo representada pela televisão
regional do estado (FR3), pelos jornais regionais "La Voix du Nord" e "Nord Matin" e pela rádio
Nacional (RTL). A RTL difunde a informação nessa mesma noite e no dia seguinte; a FR3 não faz nenhum
comentário sobre o assunto; o "Nord Matin" (socialista), escreve um artigo agressivo contra o Sr. P. e
contra a associação "La Trêve de Dieu", comparando-a a "uma seita protestante"
e o "La Voix du Nord" dá a notícia de forma sucinta, mas correta.
Nesta mesma semana, ficamos sabendo por diferentes meios que Clinton tinha a intenção de importar o RU
486 para os Estados Unidos. Pareceria ser que a informação ainda não tinha cruzado o Atlântico,
pois o RU 486 é uma droga perigosa e aqueles que a distribuam, receitem ou fabriquem serão objeto permanente
de causas legais; RU 486 não é um bom negócio.
UM ACIDENTE PREVISÍVEL
A autorização de venda (AMM) de RU 486, associada com prostaglandinas (NALADOR), foi outorgada,
depois de ter sido várias vezes modificada devido ao risco mortal que apresenta, sem que, infelizmente, tenha sido
retirada da venda; caso contrário Nadine WALKOWIAK não estaria morta.
O pedido de AMM foi feito por Roussel-Uclaf, perante o Ministério de Saúde, em 9 de outubro
de 1987 para ser examinado pela comissão de AMM de 18 de dezembro. No mês de novembro de 1987, o Diretor de
Farmácia e Medicamentos leva ao ministro as "dificuldades" que apresenta RU 486:
"Seria recomendável fazer uma exaustiva avaliação dos aspectos técnico,
jurídico e ético antes de uma decisão definitiva com relação à autorização
para a venda da MIFEGYNE".
Esta avaliação exaustiva nunca foi feita. A avaliação mais aproximada, feita
pela Comissão Internacional de Enquête (CIE), não foi levada em conta a posteriori pelas autoridades
sanitárias. Por sua parte, o Diretor Geral de Saúde manifesta reservas sanitárias, regulamentares,
éticas e médicas, em uma nota de 27 de novembro de 1987. Nessas condições precárias e
ambíguas, a Comissão de AMM, encabeçada por Jean-Michel ALEXANDRE e cujo porta-voz é Roger HENRION,
"pede um recesso para dar seu parecer, alegando que o expediente estava incompleto" e que "a
Comissão não quis abordar o debate sobre a natureza do parecer a ser emitido" (Comunicado de imprensa
emitido pelo Gabinete do Ministro de Saúde, em 15 de janeiro de 1988).
Em 30 de maio de 1988, Roussel-Uclaf apresenta "elementos complementares" destinados à
Comissão de AMM. Uma nova comissão de AMM reúne-se em 23 de setembro de 1988 para pronunciar-se sobre
a associação das prostaglandinas com a myfegin: a conclusão é muito discutível, pois
a comissão constata:
"Persistem, no entanto, inconvenientes:
- existência de um potencial teratogênico;
- imposição para que a mulher tome uma decisão rápida, apesar da semana suplementar de prazo
(49 dias de amenorréia);
- risco de abandonar o tratamento devido ao procedimento;
- risco de passar por alto uma gravidez extra-uterina e
- risco de iso-imunização".
Apesar destes inconvenientes, e de reconhecer, inclusive, que "RU deve destinar-se somente àquelas
mulheres suficientemente informadas e responsáveis" (...)", a comissão de AMM dá um
parecer favorável à utilização seqüencial da mifepristona e dos sucedâneos da prostaglandina
antes mencionados", ou seja:
"gemeprost 1 mg, óvulo (CERVAGEM) ou Sulprostona 250 æg, IM (NALADOR)"
Nesse mesmo dia 23 de setembro, em um comunicado de imprensa, o Roussel-Uclaf difunde, primeiro perante
os responsáveis da unidade na França e no estrangeiro e depois perante o público, a seguinte informação:
"o RU 486 acaba de obter autorização para ser vendido na França". O
que era absolutamente falso já que, embora a comissão tenha dado um parecer favorável, faltavam ainda
três meses para que o Ministro da Saúde outorgasse dita AMM, por um período de cinco anos. O decreto
ministerial será publicado no dia 12 de janeiro de 1989.
Enquanto isso, tem início uma forte campanha pública contra RU 486, por parte dos antiabortistas,
e se acentuam as diferenças entre os partidários e os adversários do RU 486, dentro do Roussel-Uclaf.
Contrariamente às interpretações mais freqüentes, as diferenças aparecem não só
por critérios de ordem moral, mas também pela oportunidade de fabricar e distribuir este produto tão
pouco seguro. Em 26 de setembro de 1988, uma questão de ética profissional leva o grupo Roussel a suspender
a venda do produto. Imediatamente depois, e invocando "o interesse da saúde pública",
o Ministro da Saúde intima o grupo Roussel a rever sua decisão. Tal intimação será
anulada pelo Conselho de Estado, por abuso de poder em 25 de janeiro de 1991.
Enquanto revisava os trabalhos das duas comissões da AMM, a Comissão Internacional de Pesquisa,
mais especificamente seu comitê científico-médico, consultou os endocrinologistas especialistas em esteróides
da França, tanto da comunidade científica quanto do próprio Roussel. O mesmo foi feito nos Estados
Unidos, na Alemanha, em Luxemburgo, na Itália e na Suíça, principalmente. O relatório científico
foi dado a conhecer no dia 4 de abril de 1990. O relatório concluía que era preciso "suspender imediatamente
a distribuição e utilização do RU 486" ; enquanto isto, a Comissão Internacional
de Pesquisa lamentava a "confusa manobra do Ministério da Saúde" que representava a convocatória
do Comitê Nacional de Farmacovigilância, reunido no Ministério em 3 de abril de 1990 (o Comitê
solicitou ao Roussel-Uclaf que dirigisse uma carta aos que prescreveram RU 486, onde se detalhavam os riscos do produto)
e se convocava, urgentemente, o grupo de trabalho da comissão do AMM para 13 de abril de 1990 (para dar maiores detalhes
sobre o uso das prostaglandinas e para introduzir modificações na redação da autorização
de venda - AMM).
Durante mais de um mês a imprensa escrita, a rádio e a televisão, assim como a imprensa
médica especializada, voltaram a falar sobre o relatório que anunciava as modificações que o
ministério ia introduzindo.
Foi assim que dois dias depois de sua publicação, em 6 de abril de 1990, a comissão
do AMM introduziu entre as modificações:
"CONTRA-INDICAÇÕES
É importante respeitar imperiosamente as contra-indicações dos medicamentos utilizados e especialmente:
- os antecedentes cardiovasculares
- os antecedentes de asma e de bronquite espasmódica"
e indicava também:
"Não é aconselhável utilizar a associação myfegyn/sucedâneos
de prostaglandinas, quando o risco cardiovascular vê-se incrementado pelos seguintes fatores:
tabagismo, hiperlipidemia, diabetes,
hipertensão arterial, antecedentes familiares de patologia vascular que aumentam com a idade".
O Ministério da Saúde comunicou esta modificação da AMM, contendo dezoito páginas,
ao Roussel-Uclaf, em 13 de abril de 1990, e a Direção de Hospitais do Ministério da Saúde ficou
encarregada de transmiti-la aos correspondentes centros de saúde, por intermédio das autoridades departamentais
em 12 de abril de 1990:
"Foram observados efeitos secundários graves de índole cardiovascular durante o seguimento
da farmacovigilância do sucedâneo das prostaglandinas injetáveis Nalador, seja administrado sozinho,
ou em associação com MIFEGYN."
Este tipo de risco não foi suficientemente denunciado pela Comissão Internacional de Pesquisa.
Apesar de o nível de gravidade ter sido reconhecido pelas autoridades responsáveis, e pela classe médica,
a única medida efetiva, no entanto, que seria suspender a utilização de Mifegyn, não foi tomada.
Esta situação nos faz lembrar outro escândalo: a transfusão de sangue contaminado
aos hemofílicos. Todos sabiam, mas no entanto, nada foi feito. Um escândalo, já que em 23 de março
de 1991 (um ano depois da circular de 12 de abril de 1990), no hospital de Lens, no Norte da França, morre a senhora.
N. WALKOWIAK, depois que lhe aplicaram uma dose de mifegyn-prostaglandina Nalador.
Foi preciso chegar a essa morte, que veio à luz embora este não seja o único acidente,
para que a comissão da AMM, durante a reunião de 19 de abril de 1991, ao revisar o parecer, taxado de confidencial,
reconhecesse que "o risco inerente do método RU 486 + prostaglandina é similar ao do risco da anestesia
geral". Estas foram as palavras escritas um ano antes no relatório científico da CIE. Mais tarde
esta comissão reconhece:
"todos os acidentes cardiovasculares graves foram observados em mulheres fumadoras de 30, ou mais,
anos de idade, depois da aplicação de Nalador, em todos menos um caso, na administração de IM."
- e acrescenta mais contra-indicações.
Quer dizer que já existia a prova de que este produto era nocivo. Sabe-se que pode
fazer dano à criança, à qual nem sempre elimina, e pode matar a mãe. Sabe-se, também,
que todos tinham conhecimento prévio de sua nocividade, antes do falecimento de Nadine WALKOWIAK.
É evidente que o hospital de Lens nunca devia ter optado por fazer o aborto químico na senhora
WALKOWIAK. Em primeiro lugar, porque tinha a obrigação de conhecer perfeitamente as dificuldades da associação
MYFEGYN-NALADOR, já que 250 dos 1000 abortos que pratica por ano são feitos por este meio e, segundo, porque
tinham conhecimento da história clínica e do passado médico de Nadine WALKOWIAK. Somente o dado de
sua adição ao tabaco, que figura em sua história clínica, devia ter sido motivo para descartar
a escolha de dito procedimento. As contra-indicações são categóricas (comissão da AMM
de 6 de abril de 1990) e se encontram também no VIDAL.
SÍNTESE E RESULTADO
Fevereiro de 1997
Depois de cinco anos de batalha judicial, o tribunal administrativo de Lille condenou o hospital de
Lens pela morte de Nadine WALKOWIAK depois de um aborto feito com RU 486. O marido e os cinco filhos receberam 670.000 Francos
pelos danos e o hospital não apelou: a sentença, definitiva, foi executada.